EdLua.Artes

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sábado, 9 de julho de 2011

Conto de Fadas?

As Rosas do Amor
Edgar Izarelli de Oliveira

Eu ouvi, uma vez, essa história antiga e quero repassar suas mensagens secretas a todos que se perguntam, assim como eu: afinal, o que significa o amor? Loucura ou devoção?

Há muito tempo atrás, numa época, mais nobre, em que cultivar flores era considerado arte maior, pois que havia tamanho carinho pela vida e suas belezas que era impossível considerar belo algo que não pudesse ser apreciado com todos os sentidos, havia também um homem capaz de cultivar qualquer flor, um nobre jardineiro (nobre mesmo, de brasão folhado a ouro fechando a capa e tudo) capaz de não só cultivar, mas também criar novas variedades de plantas cada vez mais maravilhosas. Era mesmo um magnífico trabalho.

Esse jardineiro morava num pequeno castelo, nos campos próximos a uma grande floresta que todos achavam ser lar de uma das mais terríveis bruxas do mundo, um lugar quase deserto, mas só ali encontrave-se a terra fértil de que precisava, por isso não era de se estranhar que fosse um tanto quanto recluso e solitário. Os poucos amigos que freqüentemente se maravilhavam com as flores eram camponeses e mercadores. De vez em quando, algum nobre da corte real, de passagem por aquela cercania, via de longe o castelinho e vinha ver a quem pertencia. Estes últimos sempre lhe diziam para expor suas obras de arte para a nova realeza, afirmando que lhe seria consagrado o posto de Jardineiro Real, mas ele sempre ignorava; dizia que as terras da corte não davam flores bonitas e ficava ali, dia-a-dia dedicado a suas flores.

Eis que um dia, ao acordar de manhã e sair ao jardim, encantou-se ao ver uma mulher admirando suas obras de arte com a delicadeza campestre de que tanto gostava, as roupas mostravam que ela tinha certa posse material, mas era simples de coração. O único detalhe que a tornava desagradável aos olhos dele, era o que certamente movia muitos olhos cobiçosos para ela, o atestado de sua perfeição. Além da beleza sutil, da simplicidade, das boas roupas, havia o brasão da Família Real em ouro maciço entre seus seios. Era uma princesa que, de tanto ouvir rumores sobre um floricultor fantástico em seu reino, fora averiguar com seus próprios olhos e, agora maravilhada pela beleza e saúde das flores, pedir para que ele lhe desse uma flor.

O jardineiro, calado, ia pegar uma rosa vermelha, mas a princesa o impediu, alegando que rosas ela já conhecia todas. Ela queria algo feito só para ela e queria acompanhar a criação. O jardineiro, apontando para um canteiro de plantas sem flores, disse que aquelas eram as melhores flores que ele já tinha feito para uma nobre antes. Infelizmente só abriam de sete em sete anos, durante um único dia do início do outono e só crescia ali na cercania, por isso tinha se mudado da corte e perdido sua dama nobre para um cavaleiro sanguinário que estava mais presente.

Mostrando um outro canteiro, onde se viam flores murchas, ele explicou que havia amado mais uma vez; uma garota do campo que adorava lírios, e ali estavam os lírios tristes da morte súbita por envenenamento que a levou no dia em que iam se casar. Os lírios floresceram durante a primavera tão felizes, mas, com as primeiras chuvas de verão, eles murchavam e ficavam tristes e vazios.

Depois que ela viu o resto do jardim, todo florido e cheio de vida, se lembrou que já era final do outono; perguntou ao jardineiro pra quem eram todas essas flores que ainda estavam abertas, ao que ele respondeu “para as virtudes e emoções de um homem sofrido”, ela entendeu. As flores eram a companhia feminina dele. E soube que seria impossível ganhar uma flor a troco de riqueza ou poder, o que ele queria e precisava era uma mulher. Mas já não fazia diferença por que ela, conforme contou a ele, também já tinha sofrido muito por amor e só queria um homem que não a quisesse por dinheiro e poder, mas, sim, por ela mesma.

E fizeram um trato. Se ela provasse que era digna de uma flor, ele faria tudo pra conseguir uma que abrisse todos os dias durante todo o ano e fosse tão linda quanto ela. E se ele conseguisse essa flor, os dois se casariam.

A princesa decidiu ficar ali já que ele precisava daquela terra para cultivar suas flores. Durante todo o inverno, os dois cuidaram juntos pra que as plantas não morressem de frio. Com os primeiros raios de sol da primavera, veio a ele a idéia da flor que faria sua princesa suspirar de amores. Seria uma trepadeira de pétalas macias que exalassem um perfume não muito forte, de coloração branca com manchas rosas bem quentes, em forma de rosa.

Com a ajuda da princesa e da engenharia botânica foi fácil conseguir a tal semente e plantá-la no jardim. A planta criou raízes, cresceu, ganhou folhas e botões, mas durante um ano as flores não abriram. O inverno chegou de novo e aquela planta foi protegida do frio com mais cuidado e atenção que todas as outras. Na primavera, algumas flores estavam fracas e doentes, assim como alguns aspectos da relação de casal. O jardineiro então, concertou o erro, começou a cuidar de todas as plantas igualmente, e pediu para que a princesa ficasse mais um ano com ele. Certamente a florzinha se abriria. Vendo aquele jardim ficando bonito e vivo novamente, ela decidiu ficar, mas não sem antes refletir alguns dias.

Mais um ano se passou e a tal flor não abriu apesar da planta estar cada vez mais bonita e forte, cobrindo todo o muro do jardim com botõezinhos brancos. Era tão bonito que a princesa decidiu que não precisava da flor pra se casar com um homem que a fazia tão feliz, mesmo numa vida campestre que ela nunca sonhara ter.

Se casaram e foram muito felizes durante um certo tempo, depois todo o amor que ele dedicava ao jardim foi deixando a princesa enciumada e nostálgica de homens que lhe davam toda a atenção sempre e sempre. O jardim já não tinha mais tanto encanto. Um dia, logo ao despertar, eles brigaram e, num ataque de raiva, ele se armou de uma tesoura de jardinagem e saiu ao jardim com a intenção de cortar a planta que havia feito para ela. O dia estava raiando e, ao ver o jardim brilhando de orvalho que parecia chorar daquela intenção mesquinha, ele parou pra respirar e observar toda a beleza daquela manhã de tormenta.

O jardineiro reparou que haviam pequenos insetos dourados voando, aos pares e freneticamente, ao redor de todas as flores ainda fechadas. Achou muito estranho nunca ter visto aqueles insetos e se aproximou para ver melhor. Não eram insetos. Eram pequenos serezinhos semelhantes a anjos de orelhas pontudas que espalhavam um pó colorido nas plantas que começavam a abrir. Como faziam também as fadas e os elfos na floresta próxima a mando de um grande mago bondoso. Era o pó da fertilidade que dava tanta vida à terra.

O jardineiro impressionado, percebeu que depois de cumprirem sua missão, os pequenos anjinhos iam para a floresta. Seriam fadas? Só então olhou para a trepadeira de seu amor. Havia uma daquelas criaturinhas, já sonolenta, fechando as rosas em botão para que estas dormissem. O jardineiro olhou aquilo com muita atenção. Quando o sol saiu totalmente detrás das montanhas, a última rosa se tornou um botão e o resto do jardim floresceu. Era o primeiro dia primaveril, totalmente aberto e receptivo ao amor.

O jardineiro largou toda a maldade do corte brusco de rosas tão lindas e, naquela noite, teve todo o trabalho de manter sua princesa acordada, ainda que ela estivesse de cara fechada e inóspita ao seu abraço mais amoroso, só para presenteá-la com as rosas do sentimento, finalmente abertas, e uma frase sábia e romântica:

“Hoje eu percebi que nosso amor, exatamente como as rosas que o demonstram, só pode ser apreciado em seu máximo esplendor quando todas as outras virtudes estão dormindo. Fica muito mais visível e bonito assim, do contrário seria só mais uma flor no meio do jardim. Quer se casar comigo, minha princesa?”

E, como terminam os contos de fadas, cheios de metáforas e portas escondidas... Afinal. eles foram felizes para sempre, apesar de, às vezes, brigarem e terem que ficar um pouco longe um do outro! Acontece... Vai se fazer o que? É impossível evitar o inverno, mas é possível cuidar do jardim. E nós, seremos felizes?